O diretor francês Jacques Tati tem em seu currículo filmes que continuam atemporais como "Meu Tio" (Mon oncle, França 1958) e "Playtime - Tempo de Diversão" (Play Time, França 1967) e o foco de Tati sempre foi a crítica social a burguesia francesa das décadas de 50 e 60 e o Sr. Hulot com a sua ingenuidade criticava esta classe social de forma inteligente e inocente.
Os anos se passaram e Tati fez poucos filmes e sempre utilizando o mesmo personagem o Sr. Hulot, porém um roteiro inacabado de Tati intitulado "O Mágico" (L'Illusionniste, França 2010) foi uma homenagem póstuma a altura que este ícone do cinema francês sempre mereceu e o diretor Sylvian Chomet do já excelente "A Bicicletas de Belleville" (Les Triplettes de Belleville, França 2003) soube captar toda a escência do personagem mais famoso de Tati e realizar uma animação que é tão boa quanto o seu outro longa.
Na história somos apresentados a um mágico em fim de carreira que percorre várias cidades européias em busca de uma platéia que ainda se interesse pelos seus truques de ilusionismo, porém com a aproximação dos anos 60 e o rock'n'roll fazendo a cabeça dos jovens, o velho mágico vai perdendo espaço aos poucos e não lhe restam muitas opções para os seus números a não ser se apresentar em teatros decadentes, bares, tavernas e até em vitrines de lojas de departamento (alias Chomet neste segmento mais uma vez critica o capitalismo e o consumismo de forma inteligente).
Porém em uma de suas apresentações o mágico conhece a joven Alice uma menina cheia de sonhos que vive na Escócia e que após receber de presente do velho mágico um par de sapatos, passa a achar que este pode lhe dar tudo o que sempre sonhou através da mágica e então resolve seguir viagem com ele para a sua próxima parada que será em Edinburgo onde a maior parte da ação do filme se desenrola.
A viagem faz com que ambos os personagens comecem a passar por um processo de mudança interna, a menina deve entender que para ter as coisas que sempre desejou deve lutar para obtê-las e o velho mágico vai entender que sempre chega a hora na vida de cada um de nós de parar de fazermos o que sempre estivemos acostumado a fazer e dar espaço para que outros o façam de uma forma diferente.
O interessante é notar que Alice vai amadurecendo e deixando de ser uma menina para se tornar uma mulher, isso fica claro a partir das suas roupas que vão mudando ao longo do filme (reparem que o figurino da menina vai assumindo o de uma outra personagem clássica da literatura e que ao final com a mensagem deixada pelo mágico faz todo o sentindo).
As situações cômicas do filme em que o personagem do mágico se envolve são semelhantes as trapalhadas vividas pelo Sr. Hulot nos filmes de Tati e o nome do mágico não poderia ser outro a não ser Tatischeff o nome real de Jacques Tati. A cena em que o personagem chega bêbado ao hotel é perfeita e não deixa a desejar as performances de Tati como o Sr. Hulot.
No final o filme passa a sua mensagem sem que os personagens tenham travados diálogo algum ao longo dos 80 minutos de duração do longa, somente conduzidos pela música, expressões e pelas situações criadas a história é contada e passa ao público a mensagem de que sempre irá chegar a hora para parar de fazer o que sempre fizemos e caberá a nós saber reconhecer esse momento e termos a sensação do dever cumprido.
De uma forma mágica Sylvian Chormet faz uma homenagem a Tati e nos dá mais um longa de animação que é sem sombra de dúvidas um trabalho excelente e mais uma aula de como se fazer um bom cinema a moda antiga, com personagens cativantes e ainda com uma mensagem de que na vida tudo sempre terá a hora para terminar, porém até está hora chegar o show sempre deverá continuar.