domingo, 22 de agosto de 2010

Crítica - A Origem

Como fazer um filme que seja ao mesmo tempo inteligente e que se enquadre nos perfis de um blockbuster para milhares de espectadores. Parece tarefa impossível encontrar tal contra-ponto, porém o diretor Christopher Nolan, que também é um dos roteiristas do filme, não só achou a receita exata como faz de "A Origem" (Inception, EUA 2010) um filme perfeito em todo os seus aspectos.

A trama de início pode parecer complicada, mas tudo é feito com tanta coerência que será difícil um espectador se perder em meios aos vários sonhos em que os personagens entram e saem ao longo da projeção. 

No filme acompanhamos Cobb (vivido por Leonardo DiCaprio) e sua equipe em uma última missão, após serem contratados pelo magnata japonês Saito (Ken Watanabe), para implantarem uma idéia na mente de um outro milionário e único herdeiro de um império deixado para este após a morte do seu pai. Porém Cobb sabe que fazer a tal inserção da idéia (a inception do título original do filme) não será tarefa das mais fáceis, pois penetrar profundamente na mente de uma pessoa exigirá um alto risco para toda a equipe. Para complicar a missão de Cobb e seu grupo, eles ainda terão que lidar com o pertubado subconsciente do próprio Cobb, personificado na figura de Mal (Marion Cotillard) ex-esposa dele, que após a sua morte ainda está viva em seus pensamentos e de tempos em tempos ameaça as missões da equipe.
 
A equipe de Cobb é formada por Arthur (Joseph Gordon Levitt), Ariadne (Ellen Page) que é a sua arquiteta de sonhos, Eames (Tom Hardy) e Yusuf (Dillep Rao) um químico que inventou um sedativo capaz de fazer as pessoas dormirem profundamente por horas. A cada camada do sonho cada um desses personagens tem o seu devido destaque e isso é um outro acerto do roteiro, que dá o devido destaque ao personagem e as suas habilidades na hora certa.

O filme é cheio de referências e metáforas a todo o tempo, e diga-se de passagem as mesmas servem para ilustrar e explicar tudo o que está ocorrendo na trama. A cena em que Ariadne desce ao subconsciente de Cobb utilizando um elevador para ir ao porão (representado pela letra B de Basement) das memórias  dele, deixa clara a intenção de Nolan de explicar tudo e não deixar nada solto.
 
A princípio algum espectador pode ficar um pouco perdido com as muitas camadas de sonhos que são apresentadas durante a narrativa, porém a estrutura do filme é tão bem amarrada que não será difícil de acompanhar tudo sem entender o que está acontecendo, pois seja em um diálogo entre os personagens, seja em uma referência na própria cena ou em um close de câmera em algum objeto de cena que deixará tudo muito claro.

Por outro lado o filme tem o seu lado de cinema pipoca nas inúmeras perseguições e tiroteios que ocorrem praticamente ao longo de seu clímax de mais de 50 minutos. Pode-se dizer que "A Origem" é composto de três atos distintos. O ato um apresenta os personagens, o ato dois mostra toda uma explicação ao que está por vir e o ato três é onde a ação se desenrola para valer e mesmo assim as 2 horas e 28 minutos de projeção parecem passar em questão de segundos.
 
Os efeitos especiais contribuem para a narrativa de forma correta e a cena em que as ruas de Paris se dobram é uma das sequências que realmente impressionam no longa.

Outro destaque é a trilha sonora do filme que dá o tom certo para cada uma das cenas.

Construir filmes que exigem um pouco mais do público é a marca registrada de Nolan desde que se destacou pelo excelente Amnesia (Memento, EUA 2001) e depois pegou para si a responsabilidade de dar um novo começo para Batman no cinema, e desde então o diretor vem surpreendendo a cada filme. Mesmo em seu filme mais "fraco" The Prestige (EUA 2006), em se comparando aos demais, o mesmo tem atrativos de sobra para deixar o público querendo saber como a história que esta sendo contada irá acabar.

"A Origem" é em todos os seus aspectos um filme que irá agradar a todo espectador que embarcar nesta viagem por um mundo onde um sonho ocorre dentro de outro sonho e assim por diante. Ao final ficará aquele gostinho de querer mais um pouco daqueles sonhos, porém preste bem atenção ao objeto que a câmera foca na última cena do longa, responde a muitas perguntas e deixa algumas portas abertas ou seria melhor dizer mais alguns sonhos a serem sonhados.

domingo, 15 de agosto de 2010

Crítica - O Pequeno Nicolau

Em minha época de colégio a classe era composta por certos tipos que com certeza eram característicos em qualquer sala de aula mundo afora. Então sempre se tinha aquele aluno que era o mais popular, o gordinho, o desligado, o sabe-tudo e o puxa-saco da professora, entre muitos outros tipos e ao assistir recentemente a "O Pequeno Nicolau" (Le Petit Nicolas, França 2009) pude retornar a esta fase da infância que era cheia de inocência e qualquer problema podia ser resolvido, lógico que não sem um toque a mais de criatividade e imaginação.

E é desta premissa que parte o filme. Nicolau (vivido pelo ator mirim Maxime Godart) escuta em seu colégio um coleguinha comentar que quando chega um bebê novo na família o primeiro filho é esquecido e abandonado em uma floresta pelos pais, para que estes possam cuidar do novo filho. O mesmo menino ainda diz como reconhecer os "sintomas" da chegada do novo bebê na família e para surpresa de Nicolau os pais começam a agir da forma que este havia escutado no colégio. Logo o menino não tem dúvidas que será abandonado na floresta pelos pais. 

Nicolau então recorre ao auxílio dos seus amigos para afastar a ameaça de perto dele e é a partir deste ponto que a imaginação dos garotos irá correr solta ao longo do filme inteiro. Comentar qualquer coisa aqui seria estragar as inúmeras surpresas que este filme guarda em seus 95 minutos de duração e que vai cativando a platéia a medida que se aproxima do seu clímax.

O diretor Laurent Tirard faz um filme a altura da obra de Rene Gosciny (sim o personagem é mais uma criação de Gosciny que também trouxe ao mundo o personagem Asterix e toda a sua turma) e todo o universo infantil é tratado da forma que deve ser tratado. E em um determinado momento do filme em uma das tentativas que os meninos fazem para... ops... melhor não comentar... mas a homenagem a Asterix está ali e não precisa ser fã deste personagem para reconhecer a referência e diga-se de passagem rende um dos momentos mais engraçados do filme, entre vários outros.

Outro aspecto interessante do filme é como o roteiro amarra de forma inteligente, as situações que são tramadas pelo núcleo infantil do filme  e reflete isso no núcleo adulto do filme. Pois estes dois núcleos se entrelaçam de forma tão perfeita que as consequências das ações de um irá causar uma situação inusitada no outro núcleo e vice-versa. Isto é sem dúvida alguma um acerto primoroso do roteiro e porque não uma aula de como se fazer um bom roteiro e não deixar pontas soltas.
 
Mesmo tendo pouca duração (o filme dura 95 minutos incluindo os créditos iniciais e finais), o filme passa a sua mensagem e faz com que o público se enxergue dentro de um daqueles personagens ou reconheça alguém que fez parte da sua infância na época do colégio.

Com tantas qualidades a seu favor "O Pequeno Nicolau" é um filme para ser visto e revisto, pois o mesmo é  leve e agradável de se assistir. Tantos os adultos quanto as crianças irão se divertir e ao final da sessão com certeza irão querer um pouco mais de tudo aquilo. 

"O Pequeno Nicolau" é sem dúvida alguma um dos melhores lançamentos de 2010 até o momento e com toda certeza já tem lugar garantido entre os indicados ao Oscar de melhor filme de língua estrangeira no ano que vem. Não tomarei por surpresa se levar a estatueta e será com honra ao mérito.